sexta-feira, 18 de outubro de 2013

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

OUTUBRO

Elton Simões

No Norte, perto da ponta do mundo, Outubro traz o Outono. As cores mudam. As árvores desfilam cores diferentes. Vestem-se, em diferentes tonalidades de amarelo ou vermelho, provavelmente causando inveja aos pinheiros que, teimosamente, permanecem verdes

Outubro inaugura aquela época do ano em que já se pode encarar o ponto randômico no tempo que escolhemos para marcar a passagem do ano. O ano novo fica visível como um ponto de luz no fim do túnel. Próximo o suficiente para ser visto, mas longe demais para determinar sua substancia.

Visto de outubro, a luz do ano novo não permite dizer se por ai vem o trem ou o fim do túnel. Apenas que a luz esta lá, chegando cada vez mais perto no ritmo da batida do relógio. A cada tic, e em todos os tac, o ano novo fica mais perto, mais nítido, mas igualmente incerto.

É nesta altura do ano em que começamos a nos convencer que o ano está definido. O que será, será. Ou já foi. Dá para olhar para trás e ver as oportunidades perdidas sem, no entanto, conseguir ressuscita-las ou reverte-las antes que acabe o ano gregoriano.



Dá para lembrar e esperança do começo do ano. As promessas de vida melhor. As previsões de PIB maior com inflação menor. A impressão de que a justiça, enfim, embora muito tardia, poderia, uma vez ao menos, não falhar.

Dá para lembrar-se do povo se encontrando na rua buscando, pacificamente, uma vida melhor, mais justa, mais cheia de esperanças e menos tomada por promessas frustradas. O gigante que (parecia) havia acordado voltou a descansar. Ou talvez a apatia esteja irremediavelmente tatuada em seu DNA.

De outubro, dá para ver que, para acalmar o gigante, bastou apenas que lhe fossem administradas algumas doses dos flácidos solilóquios que fazem dormitar bovinos. A esta altura, em sono profundo e em berço de qualidade duvidosa, o gigante apenas sente a dor de não ser e a vergonha de já ter sido. E nada mais.

Talvez esquecer alivie o desconforto causado pela diferença entre intenção e fato. Mas memória tem suas crueldades. É às vezes até sádica. Com dificuldade, aprende a se lembrar. Mas jamais aprende a esquecer. Outubro é quando dá para sentir o quanto a esperança é bela. E o quanto é frágil.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

A BANALIZAÇÃO DO MAL




Compartilho este texto com os leitores de nosso blog, embora extenso; para reflexão!

Blog Sombra Lua

“Não peço nada, eu não quero me envolver,
Na rua nua em cada cara uma desgraça.
Há tanta gente procurando esquecer,
Que a vida é à-toa, a morte chega e tudo passa.

Não peço nada, eu não quero me envolver,
Até a lua tem as nuvens por mordaça.
Assassinada mesmo antes de nascer,
A esperança sobe aos céus como fumaça.”

In: Um Grito Parado No Ar – de Toquinho e Gianfrancesco Guarniere


A mulher é assassinada pelo ex companheiro que não aceita a separação. Família de policiais é dizimada numa única noite. Policiais e juízes honestos são exterminados. Moradores de favelas desaparecem nas mãos da polícia que deveria promover a “pacificação”. Adolescente mata colega por ciúmes do namorado. Homem que denunciava extratores ilegais é abatido em emboscada. Mulher mata mãe de um recém-nascido para sequestrá-lo. Gays são supliciados em plena avenida Paulista. Mulheres são perseguidas, violentadas e mortas.

Mata-se da mesma forma com que se exterminam baratas.

E seguimos assistindo, entre perplexos e horrorizados, uma violência imensa e crescente contra inocentes e vulneráveis seres humanos.

A filósofa Hannah Arendt nos alertou para o fato de que por trás de todo o mal existem pessoas banais escondidas em seus gabinetes. Frisou que o mal carrega em si o potencial de se espalhar como um fungo e que isso só acontece por causa da incapacidade das pessoas pensarem sobre o que está ocorrendo de fato. Sobre o que elas e seus pares estão fazendo de verdade. No fundo, sobre as consequências de seus atos.


Propôs, enfim, que deixássemos de enxergar banalidade em qualquer forma de mal concebendo, enfim, a espantosa pluralidade da condição humana. Que prestássemos muita atenção na perigosa banalização do mal.

O que vemos hoje é a institucionalização do mal, democraticamente distribuído entre os poderes constituídos e absolutamente mergulhado em um sistema político que promove a violência e a coerção – que são aceitas como “parte integrante”  do processo civilizatório monopolizado pelo Estado que, em nome de salvaguardar-se, institucionaliza e burocratiza o mal.

A audiência da novela das nove onde destacam-se e, de certa maneira, enaltecem-se comportamentos pouco éticos e profundamente amorais da esmagadora maioria dos protagonistas, é um exemplo bastante contundente deste panorama. Ali, de tudo o que há de ruim existe um pouco: a mocinha pobre que sonha em dar golpe da barriga incentivada pela mãe que, provavelmente, se prostituiu na juventude; o jovem médico que flerta com o chefe homossexual para subir de posto; a médica que registra ilegalmente uma criança e, depois, provoca a morte de uma enfermeira; o irmão que joga o sobrinho no lixo; o médico que trai a esposa reiteradas vezes; a esposa que tolera tais mal tratos; o estudante carreirista que usa uma mulher mais velha para se dar bem; a moça gordinha desesperada para transar; a prostituta que casa com o filho homossexual do amante; a secretária que dá o golpe…. são tamanhas sandices e mau-caratismos que torna-se desnecessário continuar a contar.

A degradação humana, filtrada por oportunistas critérios de classe – que tantas vezes apontam para a responsabilidade da miséria e do crime ‘que descem a favela’, fechando os olhos para os motivos que fizeram a miséria e a favela existirem – é ainda revertida como sucesso de público para o espetáculo humano que, à moda de uma tragédia grega, é mostrado pelos canais de TV ao vivo e em cores, alcançando uma plateia anestesiada e incapaz de articular causas e consequências.


E por que ficamos tão reduzidos em nossa capacidade crítica frente a claros e flagrantes exemplos de violência e injustiça?

Sabemos que o aparelho psíquico não tem condições de elaborar a visão de um episódio violento sem ser atingido de maneira brutal na sua essência. Logo, numa ação de autodefesa, nosso psiquismo passa a observar a cena como se esta fizesse parte de uma novela, como se não fosse real. E toda a reflexão crítica daquele ato em si fica comprometida ou nem sequer é realizada.

Em outras palavras: cada vez que uma cena de violência é exaustivamente apresentada na televisão, por exemplo, nosso psiquismo a captura com o mesmo impacto. Todas as vezes – e como se fosse a primeira vez. Isso traz repercussões psíquicas. Podemos nos tornar fóbicos, neuróticos, delirantes ou, simplesmente, alienados.

Nesta medida é possível sentir-nos bons e justos diante de um mundo mesquinho e cruel, como se não fizéssemos parte deste universo. Há uma certa descarga emocional quando experimentamos esta (aparentemente) confortável e distante visão do ‘mal alheio’. Porém, é justamente ela que nos faz permanecer imobilizados. Temos, daí, a impressão de que tudo ‘aquilo’, que obviamente é errado e insano, pertence ao outro; e tal consciência parece suficiente para nos fazer adquirir algum mérito moral.

Não nos envolvendo com o mal, tornamos-nos parte dele no que ele traz de mais nefasto: o silêncio.


E, então, matar torna-se banal.

O pai que mata a filha. O vizinho que mata o síndico. A mãe que mata o marido. O policial que mata o suspeito. O filho que mata a avó. O operário que mata o supervisor. O assaltante que mata a vítima. O patrão que mata a empregado.

O suspeito chega na delegacia e é torturado para falar o que desejam que conte. Ele não fala e morre sob tortura. Se você não fizer o que se exige alguém pode lhe matar. Sua vida não tem quase nenhum valor. Se você for pobre este valor torna-se ainda menor.

E, deste jeito, a vida perdeu grande parte do seu significado único e sagrado. A cultura do medo, associada à cultura do mal, transformou esta magnífica e preciosa experiência em algo cada vez mais habitualmente descartável.
Por isso, é urgente que, neste processo de naturalização da sociedade e de artificializarão da natureza, a coletividade reencontre o criativo olhar para si e para o mundo, de uma maneira dinâmica e dialética. Propondo-se a dissolver tanto mal e tornar a violência um dos atos finais do intolerável clima de cumplicidade que impera nesta sociedade selvagem e indiferente.


Que os bons parem de fazer a cômodo moderação perante o barulho dos maus!

Ou continuaremos morrendo como cavalos.

Afinal, como diria Horace McCoy em seu romance retratando o auge da depressão norte-americana quando a maioria da população, sofrendo com o desemprego, carecia de uma vida digna, “They shoot horses, don’t they? ” (Eles não matam cavalos?)

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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

ACOLHIMENTO...

Richard S. Johnson

Não sei se a vida é curta ou longa para nós, mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silencio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira, pura enquanto durar. Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.

Cora Coralina

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

TRISTEZA....

                                                                  Allan R. Banks paintings


Teus olhos têm uma cor
de uma expressão tão divina,
tão misteriosa e triste.
Como foi a minha sina!!!

É uma expressão de saudade
vagando num mar incerto.
Parecem negros de longe...
Parecem azuis de perto...

Mas nem negros nem azuis
são teus olhos meu amor...
Seriam da cor da mágoa,
se a mágoa tivesse cor.

Florbela Espanca